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Dia da Consciência Negra: identificar a desigualdade racial é um passo decisivo para combater injustiças sociais
Dia da Consciência Negra: identificar a desigualdade racial é um passo decisivo para combater injustiças sociais
Ao longo do ano de 2021, além de seguir com ações humanitárias e projetos de longo prazo em prol das populações mais vulnerabilizadas, a ActionAid apoiou e publicou estudos que propunham um enfoque profundo e específico sobre a desigualdade racial no Brasil. Neste Dia da Consciência Negra, a organização reafirma seu compromisso com a luta antirracista como modo intrínseco de superação da injustiça social – afinal, é preciso identificar o racismo estrutural, sobre o qual o país se alicerçou, para que possamos seguir na nossa missão de enfrentar a fome e a pobreza.
Em abril, a ActionAid juntou esforços com a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN) e outras organizações parceiras para lançar pesquisa inédita e independente sobre a escalada da insegurança alimentar no período da pandemia: o estudo #OlheParaAFome. Os números alarmantes repercutiram no país e no mundo: mais da metade dos domicílios brasileiros (55,2%) conviveram com algum grau de insegurança alimentar nos últimos três meses de 2020, e 9% deles vivenciaram insegurança alimentar grave, passando fome na pandemia.
Os dados foram essenciais para o entendimento da situação geral – já que a última pesquisa em nível nacional sobre o tema havia sido realizada em 2018. Os índices, altíssimos, evidenciaram a necessidade de racializar o assunto. O estudo provou que a fome tem gênero, grau de escolaridade e cor. Para pessoas pretas, a insegurança alimentar grave – ou seja, a fome – chega a 10,7% dos domicílios. O percentual é de 7,5% em domicílios de pessoas de raça/cor da pele branca. A insegurança alimentar moderada também vem com desequilíbrio: atinge 13,7% das pessoas de raça/cor da pele preta, e 8,9% das pessoas de raça/cor da pele branca.
Um raio-x das desigualdades raciais
Em setembro, a ActionAid lançou um estudo que seguia mais a fundo na questão racial. O relatório Reconhecer Para Erradicar propunha um raio-x das desigualdades de gênero e raça, com múltiplos dados sobre renda, emprego, ensino, alimentação, entre outros temas.
Mais uma vez, meninas e mulheres negras são as mais afetadas. O estudo destaca que, segundo a PNAD, o percentual de pessoas pretas ou pardas mais que duplica em comparação com brancas no indicador de pobreza, e é 2,6 vezes maior na extrema pobreza. Ressalta, ainda, que mulheres negras foram as que mais sofreram com a pobreza e a extrema pobreza ao longo da concessão do Auxílio Emergencial – na fase em que o benefício foi suspenso, de janeiro a março de 2021, 41% delas estava em situação de pobreza, e 14,6% em extrema pobreza. (Fonte: MADE/USP)
O relatório aponta outros aspectos, como o acesso à renda: o rendimento principal dos homens brancos é 129% maior que o de mulheres pretas ou pardas, segundo o IBGE. O acesso aos serviços públicos e a moradia também é desigual: 26,5% de pessoas pretas ou pardas moram de maneira inadequada – seja com ausência de banheiro exclusivo na residência, pessoas em excesso no mesmo espaço ou ausência de documentos que comprovem a propriedade. O percentual é o dobro do que ocorre com pessoas brancas. (Fonte: PNAD-C/2019).
Em outubro, a ActionAid apoiou a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e organizações parceiras na elaboração do relatório Não é uma crise, é um projeto: os efeitos das reformas do estado entre 2016 e 2021 na Educação, que mapeou parte das medidas de austeridade implementadas e em discussão no país ao longo dos últimos 5 anos. Trata-se de uma colaboração com a iniciativa global da ActionAid de entender os impactos de políticas austeras, especialmente na educação.
O caderno 2 do estudo, Subsídios para uma análise a partir de raça e gênero, constata, mais uma vez, que mulheres e meninas negras são as mais afetadas. A fragilização de medidas importantes, como a Lei de Cotas, pode colocar muitos avanços sociais para a população negra em risco. O estudo alerta, ainda, para a desigualdade escolar, principalmente pelo não cumprimento do Plano Nacional de Educação.
Ana Paula Brandão, diretora Programática da ActionAid, ressalta:
O acesso à educação é uma condição fundamental para superar a pobreza. Por isso, é mais que urgente denunciar todo o projeto de desconstrução das políticas públicas educacionais que está em curso no Brasil, especialmente nesse momento de crises econômica, climática e humanitária. A pesquisa confirma essa urgência de revisitar o papel redistributivo fundamental dos estados e de reimaginar o setor público, numa discussão realmente comprometida com o futuro do país.
Há mais de 20 anos, a ActionAid vem apoiando organizações locais e contribuindo para o fortalecimento de projetos que buscam combater as diversas injustiças sociais no país. Como apontam os estudos publicados, a maioria da população em situação de vulnerabilidade, sem acesso a direitos básicos para uma vida digna – portanto, alvo de nosso trabalho – é formada por pessoas negras, quilombolas, indígenas. Mas é preciso ir além nessa jornada. Para mudar, precisamos de um país majoritariamente antirracista.
Nesse sentido, a ActionAid uniu esforços com outras cinco organizações para um importante e ousado passo, numa proposta para que o fim da discriminação racial na educação se transforme em realidade: o projeto liderado pelo autointitulado Grupo Brasil – formado por ActionAid, Ação Educativa, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, CONAQ (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas), Geledés Instituto da Mulher Negra e UNEafro Brasil – foi selecionado entre os dez finalistas para o Desafio de Equidade Racial 2030, da Fundação W.K. Kellog, numa chamada mundial de soluções inovadoras que tem o propósito de criar um futuro de condições mais igualitárias a crianças, famílias e comunidades em todo o globo.
Juntas, as seis organizações proponentes pretendem conciliar conhecimentos e mobilizar ações que envolvam a juventude, movimentos negros e educacionais em um processo que desencadeie sensibilização em todo território nacional. c
Tricia Calmon, especialista em Monitoramento e Projetos da ActionAid, completa:
O racismo se refere a um fenômeno histórico que tem transcendido séculos e diferentes contextos sociais. Não se trata, portanto, de problemática de simples solução que possa ser empreendida por alguma geração brilhante. É necessário realizar um investimento social agressivo, mas é também necessário não perder de vista de que se trata de relações de poder, e poder nunca é cedido. Aos aliados do combate ao racismo, cabe criar as condições e se dispor a enfrentar os conflitos inerentes ao questionamento aos privilégios de ser branco no Brasil. À parcela majoritária negra, cabe o protagonismo na tecitura da luta e ter as condições de contar a sua própria história.
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