Só o feminismo constrói
A forma como acessamos a cidade diz muito sobre como ela foi pensada e construída. O caminho que escolhemos para chegar ao nosso destino é um exemplo disso. Muitas vezes, preferimos caminhar por ruas mais iluminadas e que tenham mais gente transitando, mesmo que isso signifique um percurso mais longo e demore mais tempo. O mesmo acontece com o transporte público. Preferimos entrar em vagões mais vazios ou ônibus menos lotados, ainda que isso signifique mais tempo para chegar em casa depois de um dia cansativo de trabalho. E se não tivermos essa opção, criamos estratégias de defesa para evitar sermos assediadas ou sofrer outros tipos de violência.
Escolhemos estrategicamente onde sentar ou onde ficar em pé. Por onde caminhar e a que horas sair. Que roupa vestir ou o tamanho dela. Esse é o cotidiano de toda mulher que acessa a cidade.
Uma pesquisa recente da ActionAid mostrou que 90% das brasileiras já trocaram de roupa por medo de serem assediadas e 86% sofreram assédio em público. Esses foram dados coletados pela campanha Cidade Segura para as Mulheres, liderada pela ActionAid, que visa reduzir a insegurança das mulheres nos espaços públicos. Foram ouvidas mulheres de todo o país e a realidade é a mesma apesar da diversidade cultural do Brasil. A raiz é comum: o machismo. A forma como nós mulheres somos criadas e os estímulos que recebemos de atores sociais com os quais nos relacionamos com o mundo (escola, mídia, igreja, família, etc.) nos impõe limitações na nossa vivência plena ao direito à cidade.
Ao mesmo tempo em que esta realidade nos afeta diariamente, mobilizações surgem através de mulheres, que questionam cada vez mais a cultura de estupro que marca suas vidas. Mulheres ativistas, organizadas em coletivos e movimentos, vêm trazendo muito forte o feminismo à tona e provocando discussão e mudança de comportamento, inclusive do mercado e da mídia.
Para fazer coro a esse movimento, a ActionAid lançou a campanha #ACulpaNãoéDaRoupa em parceria com o Enjoei. O objetivo é desnaturalizar o assédio e evidenciar o direito das mulheres de usarem a roupa que quiserem sem ser vítimas de assédio ou outro tipo de violência, reforçando a premissa que a culpa do assédio NUNCA é da vítima e sim do agressor. Ao mantermos a sociedade atenta, fazemos com que ela seja corresponsável pela construção de novas práticas. A intenção é que a gente se dê conta de que juntas, somos mais fortes!