Um novo relatório realizado pela ActionAid destaca os impactos devastadores da guerra em curso em Gaza e a escalada da violência na Cisjordânia sobre as mulheres e meninas palestinas, bem como sua notável resiliência e liderança diante da crise.
O relatório, intitulado “Agentes de mudança: O papel das organizações lideradas por mulheres na Palestina em tempos de crise”, pede um aumento no financiamento para organizações lideradas por mulheres e a inclusão urgente de mulheres nos processos de construção da paz e reconstrução. O documento destaca a necessidade crítica de abordagens sensíveis ao gênero que abordem os desafios únicos enfrentados por mulheres e meninas.
Baseado em depoimentos de mulheres que vivem em Gaza e na Cisjordânia, incluindo ativistas e líderes, o relatório detalha os desafios graves enfrentados por mulheres e meninas, desde o aumento do risco de violência baseada em gênero até traumas psicológicos profundos. Ele revela, ainda, a extraordinária resiliência que elas demonstram diariamente ao impulsionar a recuperação da comunidade e defender uma paz justa.
As principais descobertas do relatório incluem:
- Impacto Emocional e Psicológico Invisível: As mulheres palestinas têm sido desproporcionalmente afetadas pela guerra em Gaza, enfrentando níveis extremos de estresse, ansiedade e trauma. O deslocamento constante colocou as mulheres em um estado perpétuo de instabilidade, com uma jovem de 16 anos que afirma: “Nós não sabemos para onde ir para encontrar segurança.” As condições de vida superlotadas exacerbam as tensões, com outra menina expressando: “Ninguém consegue tolerar o outro.”
- Aumento da Violência de Gênero: A guerra contínua em Gaza agravou as ameaças enfrentadas pelas mulheres, aumentando o risco de violência sexual e de gênero, casamento forçado e exploração. Mulheres em campos de deslocamento relatam uma perda drástica de privacidade e segurança, muitas vezes enfrentando assédio e abuso em abrigos superlotados. Uma participante de um grupo focal comentou: “No passado, as paredes eram nossa cobertura, hoje é apenas um pedaço de náilon.” Na Cisjordânia, as mulheres enfrentam violência tanto de soldados israelenses quanto de colonos. Recordando um incidente, uma ativista de Hebron disse que sua vizinha foi “levada para dentro de um quarto [pelos soldados israelenses], todas as suas roupas foram tiradas e [eles] deixaram um cachorro atacá-la, na frente de seu marido e filhos.”
- Perda de espaços seguros e de apoio específico para mulheres: Ao mesmo tempo, o acesso a espaços seguros e ao apoio para mulheres que sofrem violência sexual e de gênero foi drasticamente reduzido devido a deslocamentos forçados repetidos, falta de financiamento e dificuldades de comunicação. Como disse a líder de uma organização liderada por mulheres em Gaza: “Algumas mulheres se divorciaram durante a guerra, não pudemos oferecer o suporte como costumávamos fazer, não havia mecanismos de comunicação, nossa equipe não conseguiu alcançá-las.” O colapso completo do sistema jurídico de Gaza criou um vácuo legal, deixando as mulheres sem a possibilidade de obter justiça.
- Grave Crise no Cuidado Obstétrico: O relatório expõe o estado crítico da saúde materna em Gaza, onde mulheres grávidas enfrentam partos de alto risco com pouco ou nenhum suporte médico, resultando em desfechos trágicos. O Dr. Adnan Radi, do hospital Al-Awda em Gaza, relatou: “um aumento acentuado na taxa de gestações [de alto risco], complicações [relacionadas a] partos prematuros, aumento de abortos espontâneos e problemas como infecções, septicemia, hemorragias, entre outros.” O acesso a cuidados adequados de saúde sexual e reprodutiva é virtualmente impossível em Gaza, com o gerente de um centro de saúde feminino comentando: “não é possível inserir um DIU devido à falta de esterilização dos materiais necessários pelo médico.”
- Sobrecarga de Trabalho e Responsabilidades Adicionais: As mulheres que vivem nos campos de deslocados em Gaza assumiram tarefas fisicamente exigentes e demoradas para manter suas famílias em uma zona de guerra, desde carregar pesados baldes de água até suas tendas até cozinhar em fogueiras a céu aberto, além de assumir mais responsabilidades de cuidado. Em meio à grave escassez de alimentos, as mulheres comem por último e em menor quantidade para garantir que outros na família sejam alimentados, como Hala, uma funcionária da Alianza por la Solidaridad, comentou: “A pior coisa que as mulheres fazem é se colocarem no final de tudo, as últimas da lista, despriorizando a si mesmas e cuidando dos outros.”
- Liderança Feminina em Meio à Crise: Apesar dos imensos desafios, as mulheres palestinas assumiram papéis de liderança essenciais em suas comunidades. Desde a gestão de campos de deslocados até a defesa por recursos, as mulheres estão liderando ativamente os esforços para reconstruir Gaza. Samira, a gestora do Campo Al-Istiqama, transformou seu luto pessoal em apoio à comunidade, dizendo: “Depois de perder meus filhos e minha casa, assumi a responsabilidade de ajudar as pessoas deslocadas.”
Apesar de sua experiência única e anos de trabalho apoiando suas comunidades, as organizações lideradas por mulheres na Palestina muitas vezes são marginalizadas. Faraha, que dirige uma organização no campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia, comentou: “As organizações lideradas por mulheres são de certa forma negligenciadas. Não há uma visão real sobre como envolvê-las.” O relatório pede que as mulheres palestinas sejam ativamente incluídas em todas as negociações de paz e diálogos políticos relacionados ao futuro da região, e que sejam reconhecidas como agentes essenciais de mudança na recuperação de Gaza.
Riham Jafari, Coordenadora de Advocacy e Comunicações da ActionAid Palestina, afirma:
“As mulheres e meninas na Palestina enfrentam desafios únicos e severos à medida que a devastadora guerra em Gaza continua e a violência na Cisjordânia se intensifica. No entanto, em meio a essas crises, elas demonstram uma resiliência notável e estão emergindo como líderes confiáveis em suas comunidades. Suas vozes e perspectivas não podem ser marginalizadas. É hora de as partes interessadas locais e internacionais valorizarem a contribuição essencial das mulheres, aumentando o financiamento para organizações lideradas por mulheres e garantindo que elas tenham um assento à mesa quando decisões cruciais sobre a Palestina e seu futuro forem tomadas.”
À medida que a guerra em Gaza continua e a violência se intensifica na Cisjordânia, é fundamental que as vozes das mulheres palestinas não apenas sejam ouvidas, mas também que suas demandas sejam atendidas. A ActionAid pede um aumento urgente no financiamento para organizações lideradas por mulheres, cujas experiências e liderança são fundamentais para os esforços de recuperação e construção da paz. As mulheres devem desempenhar um papel central em todas as negociações de paz e processos de reconstrução, garantindo que suas perspectivas e soluções únicas façam parte da construção de um futuro sustentável para a Palestina.