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Oficinas de Mídia Advocacy transformam Meninas em Movimento em multiplicadoras de informações
Oficinas de Mídia Advocacy transformam Meninas em Movimento em multiplicadoras de informações
Texto: Aline Vieira Costa
Fotos: Micaella Pereira / ActionAid
Apesar de as mulheres representarem cerca de 52% da população brasileira (IBGE, 2019), a presença feminina na mídia ainda é sub-representada. Dados do Global Media Monitoring Project (2021), o maior estudo internacional de gênero na mídia, mostram que as mulheres são protagonistas em apenas 24% das notícias. Com o objetivo de amplificar as vozes femininas, o projeto Meninas em Movimento desenvolve oficinas de Mídia Advocacy, a fim de transformar as adolescentes e jovens participantes em multiplicadoras de informações qualificadas em suas comunidades.
As oficinas são realizadas nos sete territórios pernambucanos atendidos pelo projeto, que promove ações para o enfrentamento do abuso e da exploração sexual de crianças e adolescentes e é realizado pela ActionAid, em parceria com as organizações locais Casa da Mulher do Nordeste, Centro das Mulheres do Cabo (CMC) e Etapas, com patrocínio da Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental.
O Meninas em Movimento contempla temas como o direito à comunicação; prevenção à violência sexual de crianças e adolescentes; análise crítica sobre a imagem da mulher na mídia; orientações sobre como falar em público; além de visitas guiadas a rádios comunitárias com entrevista ao vivo. Também são ensinados conteúdos específicos, como modelos de rádio/revista para educação popular; produção de spots, vinhetas, entrevistas e campanhas de rádio; e técnicas de rádio ao vivo.
De acordo com a coordenadora de Comunicação do Centro das Mulheres do Cabo, Manina Aguiar, que atua como educadora social no projeto, a oficina de Mídia Advocacy é uma ação complementar para que as meninas se apropriem desses temas e usem o conhecimento na defesa de seus direitos e na mobilização de outras jovens, seja nas atividades em sala de aula, seja na organização do próprio projeto:
“As oficinas são um passo importantíssimo para possibilitar que essas meninas compreendam como é importante usar a sua voz para que outras meninas se vejam nelas e possam se somar nesta caminhada contra o abuso e a exploração sexual”.
A especialista em Monitoramento e Projetos da ActionAid, Tricia Calmon, que coordena o projeto, explica que o enfrentamento ao abuso e à exploração sexual é uma temática sensível, considerada tabu, o que faz com que movimentos sociais e especialistas no assunto advoguem pelo não silenciamento e pela não responsabilização da vítima:
“O desafio é justamente saber dialogar com o público mais jovem sobre um assunto tão pouco conversado. Por isso, a importância de se trabalhar como identificar o que é violência; questionar e transformar o conteúdo que consomem, nessa ótica da existência do machismo e da misoginia; e construir essa comunicação para e a partir de pessoas não adultas, movimentando o conteúdo e os instrumentos que elas dominam e qualificando o domínio e a participação delas nesses lugares de redes, de comunicação, de consumo de mídia”, ressalta.
Tricia lembra que os produtos das oficinas de Mídia Advocacy, bem como os das futuras oficinas de Digital Influencer, e os conteúdos dos Ciclos de Formação, vão municiar as meninas na elaboração da campanha “Não Brinque com Meu Direito”, planejada pela agência Angola Comunicação:
“São ações interdependentes, uma depende da outra para existir. Os sentidos de uma e de outra se completam com essa comunicação entre as atividades”, explica.
Com apenas 12 anos, Omelir Soares, da comunidade de Serraria, no Cabo de Santo Agostinho, é uma das meninas que está perdendo o medo de falar em público e já se reconhece prejudicada pelo machismo. Ela toca bateria e outros três instrumentos e sonha em ter uma banda:
“Eu queria tocar na igreja, mas teve um menino que não deixou. Se for na igreja e perguntar por mim, todo mundo vai falar que eu gosto de tocar bateria. Estou mostrando que não só homem pode fazer essas coisas”, conta ela, que admira mulheres que ocupam os lugares que ela almeja na sociedade.
E essa identificação é importante no processo. De forma conceitual e prática, as meninas têm a oportunidade de refletir sobre o lugar que as mulheres ocupam nas mídias e como elas são retratadas: se (in)dependentes, frágeis ou objetos sexualmente desejáveis, por exemplo. Também têm a possibilidade de observar se elas próprias se veem representadas nas produções, seja em novelas, jornais, clipes musicais, filmes e publicidade. A partir das trocas entre elas, conseguem perceber melhor se a mídia as ajuda a entender a realidade que vivem e a debater formas de construir uma representatividade de fato.
Jamielly Santos Aguiar, 17 anos, de Massangana, também no Cabo de Santo Agostinho, não se sente bem representada nos conteúdos que vê em sites e redes sociais, principalmente pelo excessivo apelo à sensualidade feminina:
“Antes de fazer esse curso, eu achava a internet boa, normal. Para mim, era tudo tranquilo, mas, agora, eu estou vendo, conhecendo mais, me aprofundando”, complementa a jovem, que se considera corajosa e sonha em ser bombeira militar.
A cada encontro, as meninas têm contato com conteúdos e dinâmicas com a missão de pensar formas de se comunicar, em trabalhos em grupo, com simulações de entrevistas em áudio e vídeo. As meninas também recebem informações dos profissionais de comunicação que ministram as oficinas, com orientações sobre técnica, estética, programas, aplicativos, além de dicas que só a vivência traz.
“A gente não está formando jornalistas. O objetivo do projeto é tentar que as meninas intervenham na comunidade, que sejam multiplicadoras de informações qualificadas. Se alguma delas quiser vir para cá virar uma repórter nossa, quem sabe? Eu fui um jovem comunicador. A gente quer muito trazê-las para a comunicação do CMC”, relata o jornalista Rafael Negrão, um dos educadores da oficina.
Atriz desde os 6 anos, a adolescente Kallyne Vitória, de 17, moradora de Massangana, tem uma experiência mais próxima dos meios de comunicação, por conta do trabalho. Ela sempre gostou de falar em público, de se expressar e falar alto, para todo mundo escutar a sua voz.
“Sempre gostei de ser ouvida, por mais que algumas vezes não goste de escutar. O curso me ajudou muito a ser mais companheira, a ouvir melhor, a não ser tão agressiva nas minhas expressões, a saber me posicionar melhor”, ressalta ela, que passou a trabalhar melhor em grupo a partir das oficinas do projeto.
Essa proximidade entre as meninas permite que elas se conheçam e se ajudem, sendo fundamental para que elas consigam melhor se proteger, segundo Tricia:
“A ideia é produzir um movimento sustentável em relação à rede de proteção não formal, além de buscar fortalecer também a rede formal. A gente espera que essas meninas se encontrem e se juntem, dialoguem mais sobre o tema, sejam elas próprias redes de apoio umas para as outras. De repente, estando na mesma faixa etária, conseguem dialogar entre si e buscar ajuda”.
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