Mandí: "Como engajar jovens na luta em defesa do território?"

Como engajar jovens na luta em defesa do território? Como engajar jovens na luta? Como engajar os jovens?
Talvez essas dúvidas nunca tenham estado tão fortes em nossas cabeças ao longo desses quase 10 anos de Mandí como agora. Apesar do nosso público prioritário ser jovens mulheres, negras e de regiões periféricas, nossas principais preocupações eram outras: garantir recursos para deslocamento, alimentação que atendesse a todos, materiais e conteúdos de qualidade. Essas são preocupações prioritárias porque temos uma boa conexão com nosso público-alvo, talvez por sermos uma organização majoritariamente feminina, ou talvez por termos começado nossa atuação ainda quando éramos jovens, ou talvez seja pela forma que nos comunicamos, que ao longo desses anos nos deu credibilidade em nosso território.
Por isso, quando recebemos o desafio do projeto TerritóRios de realizar oficinas sobre comunicação e ativismo para jovens do Nordeste que nunca ouviram falar de nós e que de ambos os lados não conheciam o território do outro, nos deparamos com a pergunta: como engajar jovens? Mas para nossa grata surpresa, esses jovens já estavam engajados.
Oficina em Salvador
Em setembro fomos a Salvador conhecer o Conselho Pastoral de Pescadores da Bahia e Sergipe, e a convite deles tivemos a oportunidade de nos juntarmos a cerca de 50 jovens para participar de mais uma edição do Encontro de Educomunicação com a Juventude Pescadora e Quilombola. Em nossa oficina, falamos do uso da Comunicação como instrumento de defesa dos territórios, usando como base a Comunicação Popular e Comunitária, debatemos com os jovens de diferentes idades conceitos como: território, construção e desconstrução de narrativas, colonialismo, artivismo e produção de conteúdo.

Mas e os jovens, como foram engajados? Nós os convidamos a navegarem conosco, num rio novo, um rio somente nosso, com as nossas histórias. Com um rolo de papel craft estirado no meio do auditório, construímos o Rio Pabape (união dos estados Pará, Bahia e Sergipe), a cada pergunta nova era um post it adicionado ao papel e uma nova paisagem do rio era navegada. E, foi assim que os jovens, em um sábado, se engajaram para pensar em proteção, narrativas e comunicação em prol das suas comunidades, e no final do dia, eles mostram o resultado disso produzindo conteúdos que mostram a realidade dos seus territórios. Muita coisa boa apareceu, reportagens, danças, encenações e até mesmo um cordel foi criado. Mas uma das nossas maiores surpresas foi quando um participante nos pediu as perguntas que usamos durante a oficina, pois queria replicar a atividade com outras pessoas da sua comunidade.
Oficina no Recife
No Recife, pudemos desfrutar de mais tempo com a juventude, a partir do território de vivência e atuação do Coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste e da comunidade em que vivem. Na primeira conversa com a juventude, pensamos: “e se mudarmos a rota?” e, foi assim, que trocamos o roteiro previsto para outro que se conectava com o que eles mais precisavam. Após uma conversa inicial com os jovens que integram o coletivo Não Tem Jeito (NTJ), apoiado pelo Coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste, entendemos que ali já havia engajamento entre eles, o que faltava eram recursos para manter vivo o trabalho com as crianças e jovens da comunidade. Entendendo que o NTJ já realizava atividades em defesa do território, nós compartilhamos nossas ferramentas de comunicação e trouxemos exemplos de atividades que realizamos aqui em Belém, com a intenção de inspirá-los.

Em mais um sábado de oficina, desafiamos 34 jovens que participam do NTJ a construir uma campanha narrativa com objetivo de arrecadar recursos para uma nova edição do Festival de Pipa, um dos sonhos que eles compartilharam desde o primeiro dia conosco. Apresentando as etapas de uma campanha (objetivo, meta, estratégia e táticas), dividimos os jovens em grupos e facilitamos a construção da atividade, a cada etapa concluída, abríamos o debate em assembleia e provocamos eles para avaliar o que foi desenvolvido até ali. E a conclusão disso foi um trabalho muito bem definido, em que o que foi desenvolvido em grupo completava o trabalho coletivo, no fim, os jovens compreenderam que isso tudo só é possível com fortalecimento da escuta ativa.
Nós voltamos para casa com o coração cheio de saudades do que vivemos, com inúmeras possibilidades de continuarmos essa navegação, e com a certeza de que as juventudes não estão desengajadas dos seus territórios. Na verdade, o que falta a elas é serem escutadas, fortalecidas, mas principalmente, receber suporte para que possam existir plenamente, com a segurança dos seus direitos garantidos, de ter o agora como um presente e a liberdade para sonhar com o futuro. Elas sonham ativamente e, nos encontros, sonhamos coletivamente.
Sobre o projeto TerritóRios
O projeto TerritóRios é uma iniciativa da ActionAid que trabalha em rede, em parceria com organizações e movimentos sociais, para fortalecer comunidades, lideranças e defensoras de direitos humanos e ambientais para enfrentar o racismo estrutural e ambiental e a desigualdade de gênero, por meio da produção cidadã de dados, da incidência política e do desenvolvimento de mecanismos de proteção.
A Mandí, organização de Belém do Pará que mobiliza juventudes periféricas da Amazônia pela defesa dos rios urbanos, com foco em adaptação climática e saneamento, faz parte da rede de parcerias do projeto. Assim como o Coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste – CCTR, movimento comunitário de Recife (PE) que luta pelo direito à moradia digna e à permanência no território urbano, e o Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP (Bahia e Sergipe), articulação que fortalece comunidades pesqueiras tradicionais e seus territórios.