África tem dívida climática de US$ 36 trilhões a receber dos países ricos e poluidores, aponta novo relatório da ActionAid
Às vésperas da Cúpula da União Africana (UA) nesta semana, um novo relatório da ActionAid revela que mais de três quartos dos países de baixa renda gastam mais com o pagamento da dívida externa do que com seus próprios sistemas de saúde. Além disso, mais da metade desses países destina mais recursos ao serviço da dívida do que à educação.
Por outro lado, os países ricos e poluidores devem aos países de baixa e média-baixa renda um total de US$ 107 trilhões em dívida climática — um valor mais de 70 vezes maior que a dívida externa total de US$ 1,45 trilhão que esses países devem coletivamente.
Os novos dados também mostram que os países africanos deveriam receber dos países ricos mais de 50 vezes o valor de sua dívida externa total, como compensação pela poluição da atmosfera e pela crise climática causada.
Dívida climática impede investimentos essenciais
O relatório intitulado "Quem deve a quem?”, publicado na semana que antecede a Cúpula da UA em Adis Abeba, revela como os países africanos estão deixando de investir em serviços públicos essenciais, como saúde, educação e ação climática, para pagar dívidas externas contraídas com países ricos, credores privados e instituições financeiras globais.
Enquanto isso, os países ricos não estão pagando a dívida climática de pelo menos US$ 36 trilhões que devem à África — sem mencionar outras reparações por promessas não cumpridas e exploração econômica contínua.
O estudo da ActionAid demonstra que as dívidas não pagas aos países africanos superam em muito as dívidas externas que essas nações são obrigadas a pagar.
"É um escândalo que as nações africanas estejam sendo esmagadas pelo peso da dívida externa, enquanto os países mais ricos do mundo continuam a ignorar suas responsabilidades de pagar pela crise climática e pelas reparações relacionadas ao tráfico de escravizados e práticas econômicas injustas”,
afirma Arthur Larok, Secretário-Geral da ActionAid Internacional.
“Ao forçar os países a priorizarem o pagamento da dívida em detrimento de serviços essenciais, como saúde e educação, ou da resposta à crise climática, os países ricos estão empurrando a África para o colapso”, defende Larok.
O relatório "Quem deve a quem?" revela ainda que, em 2024, os países de baixa renda da África destinaram US$ 60 bilhões ao pagamento da dívida, sacrificando investimentos em saúde, educação, direitos da população e desenvolvimento sustentável. Isso tem um impacto devastador sobre a maioria das pessoas no continente, especialmente mulheres, jovens e pessoas de baixa renda.
Na contramão, os dados do relatório indicam que os países ricos deveriam estar pagando à África um valor 25 vezes maior — pelo menos US$ 1,4 trilhão por ano em financiamento climático.
"O pagamento da dívida externa e o cumprimento das condições impostas pelos empréstimos do FMI estão prejudicando os investimentos em saúde, educação e ação climática, afetando especialmente mulheres e meninas. Enquanto isso, os países ricos não pagam suas próprias dívidas para com a África. Como isso pode ser justo?",
questiona Chikumbutso Ngosi, gerente do programa Jovens Mulheres Urbanas na ActionAid Internacional.
Sistema financeiro global injusto impulsiona a crise da dívida na África
O relatório também aponta que o sistema global de classificação de crédito contribui para a crise da dívida na maioria dos países africanos. A África é submetida a taxas de juros exorbitantes em seus empréstimos, com uma média de 9,8%, enquanto países ricos, como a Alemanha, pagam apenas 0,8% em média.
A União Africana declarou que 2025 será o Ano das Reparações, uma oportunidade para enfrentar injustiças históricas e os problemas atuais resultantes da arquitetura financeira internacional herdada do colonialismo.
"A realidade é que, para os países africanos superarem a crise da dívida e os impactos das mudanças climáticas, é essencial haver um cancelamento da dívida e uma ruptura total com o sistema colonial de endividamento que tem sufocado o continente por décadas. Neste Ano das Reparações, a União Africana deve garantir tanto o cancelamento da dívida quanto um novo marco global da ONU para a regulamentação da dívida,"
defende Andrew Mamedu, Diretor Executivo da ActionAid Nigéria.
O relatório demonstra que 2025 representa uma oportunidade real para alinhar o sistema financeiro internacional aos desafios enfrentados pelos países de baixa e média-baixa renda.
"Neste ano do Jubileu, precisamos de uma reformulação fundamental da arquitetura financeira global, deslocando o poder sobre a dívida do FMI para um órgão da ONU mais representativo e inclusivo," aponta Joy Mabenge, Diretor da ActionAid Zimbábue.
O relatório pede à União Africana e aos movimentos sociais que:
- Priorizem o estabelecimento de uma nova Convenção-Quadro da ONU sobre Dívida, para substituir a atual estrutura financeira colonial e injusta centrada no FMI.
- Unam forças para exigir cancelamento da dívida como parte do pagamento da dívida climática e de outras reparações devidas pelos países ricos.
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